Abram alas porque é hora de afinar os ouvidos com os ritmos que agitam os foliões. Várias músicas-tema, sensação do momento, devem ser repetidas exaustivamente. Há também aquelas que marcam época e são entoadas em todo o País
O brasileiro tem um gosto eclético quando o assunto é música. Durante o carnaval, quando trios elétricos, blocos carnavalescos e escolas de samba tomam conta das ruas e os bailes tomam conta dos clubes e boates, estilos como marchinhas, samba, axé, pagode, funk e pop se misturam no repertório dos músicos e dos DJs e muitos dos hits que vão tocar pelo resto do ano nas rádios e nas festas são consolidados. Alguns desses sucessos extrapolam a validade anual e são lembrados por muito tempo.
Alguns estudiosos atribuem a criação da primeira marchinha de carnaval para um bloco de rua à popular compositora Chiquinha Gonzaga. Em 1899, integrantes do cordão carnavalesco Rosas de Ouro do Rio de Janeiro procuraram a musicista para pedir um hino para a folia daquele ano. Nasceu então a marchinha Ó abre-alas, que ajudou o Rosas de Ouro a vencer a disputa. A música fez um enorme sucesso entre 1901 e 1910 e se tornou um dos símbolos do carnaval carioca. A composição é conhecida até hoje e é quase impossível não se lembrar do refrão “Ó abre-alas, que eu quero passar/ Ó abre- alas, que eu quero passar/ Eu sou da lira, não posso negar/ Rosas de Ouro é que vai ganhar.”
Muita coisa mudou de lá para cá, mas o carnaval continua sendo uma plataforma de lançamento de muitos hits musicais. Em 1993, quase um século depois de Ó Abre-alas de Chiquinha Gonzaga, a escola de samba carioca Acadêmicos do Salgueiro ficou em primeiro lugar na disputa da Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro (Liesa) com o enredo Peguei um Ita no Norte. Você pode até não se lembrar daquele desfile ou nem ter nascido naquela época, mas certamente consegue acompanhar cantando “Explode coração/ Na maior felicidade /É lindo o meu Salgueiro /Contagiando, sacudindo essa cidade.” As torcidas organizadas de futebol até hoje entoam este refrão nos estádios, substituindo o nome da Salgueiro pelo nome do time do coração.
A década de 1990 também foi a época de consagração da banda de pagode baiano É o Tchan!. Nascida como Gera Samba, o grupo ficou famosa por suas músicas eróticas e de duplo sentido e a cada carnaval lançava novos hits. O outro fator que contribuiu para disseminação de suas canções foi o trio de dançarinos formado inicialmente por Carla Perez e seus mais de 100 cm de bumbum, Jacaré e aquela outra que quase ninguém lembra o nome, a dançarina Débora Brasil, que resolveu sair e foi substituída por meio de um concurso, pela morena Sheila Mello.
A cada nova música lançada, o trio ensinava a coreografia rebolativa e quase pornográfica que era repetida em todos os lugares do Brasil por pessoas de todas as idades e classes sociais. São raras as pessoas com mais de 30 anos que nunca viram mulheres de vestido longo e homens de gravata ralarem na boquinha da garrafa quando a banda do baile de formatura atacava com um dos hits do É o Tchan!.
A banda acabou em 2007, mas, nesse meio tempo, emplacou várias músicas e forneceu material humano para as revistas masculinas cada vez que uma loira ou uma morena do grupo era substituída por outra. Atualmente, Jacaré investe em uma carreira televisiva, Carla Perez faz discos para crianças e Sheila Mello vive de ser celebridade. Recentemente, a banda se refez e agora ressurge no carnaval baiano 2011 com seis novas bailarinas loiras, morenas e negras. Só faltou uma ruiva e uma albina.
Pancadão
O funk carioca pode estar meio em baixa nos últimos anos, mas já lançou muitas músicas de sucesso durante o alto verão e o carnaval. Um exemplo é o MC Serginho, que começou a ficar conhecido em 2002 com o funk Vai, Serginho. Sua consagração, porém, só aconteceu no ano seguinte com sua Eguinha Pocotó. O reconhecimento popular não foi tanto pela letra da música (“Vou mandando um beijinho/ Pra filhinha e pra vovó/ Só não posso esquecer /Da minha eguinha Pocotó /Pocotó pocotó pocotó pocotó /Minha eguinha Pocotó”). Desta vez, o fator Lacraia, um dançarino magrelo e andrógino que fazia uma dança escalafobética, impulsionou a carreira de ambos. Por algum tempo, a dupla participou de vários programas de TV, sempre rendendo boas audiências, até que eles se separaram em 2009.
O estilo, que também é conhecido como pancadão, é recheado de letras eróticas e de duplo sentido e, assim como o pagode baiano do É o Tchan!, vem acompanhado por coreografias que promovem o rebolado geral. O funk carioca influenciou artistas internacionais, como a cantora britânica de “reggae” e “rap”, que lançou em 2005 o pancadão Bucky done gun. O Rap das armas, dos MCs Cidinho e Doca, não foi lançado no carnaval, mas, depois que fez parte da trilha do Tropa de Elite, foi sucesso em todo o País em 2007.
Soteropolitanamente
Salvador, a capital da Bahia, poderia ser considerada a maior exportadora de hits de carnaval do Brasil. De lá, saem muitos sucessos que embalam os dias oficiais de folia e as festas de carnaval fora de época que acontecem por todo o ano no País. Lá, o assunto é levado a sério e prêmios como o “Troféu Bahia Folia” elegem, com a ajuda do voto popular no site www.portalibahia.com.br, a melhor música do carnaval de Salvador. Outra premiação, o “Troféu Dodô e Osmar”, entre diversas categorias, como camarote mais animado, melhor cantor e cantora e melhor bloco afro, também escolhe a melhor música do carnaval por votação on-line (veja o site do prêmio: www.trofeudodoeosmar.com.br).
Rebolation, cantada por Léo Santana, do grupo Parangolé, abocanhou as duas premiações em 2010. A banda gostou tanto do nome da música premiada no ano passado que mais parece uma onomatopeia que lançou neste carnaval a música Tchibirabiron, cuja coreografia pode ser aprendida no YouTube e o refrão aqui no DMRevista. Pode decorar porque é fácil: “Pega na cabeça e vai /Pra frente, pra frente /Cintura, cabeça /Tchubirabiron.” As veteranas Claudia Leitte e Ivete Sangalo também investem em músicas com letras que não dizem muito, intituladas de Água (de Claudia) e Aceleraê (de Ivete).
Um outro hit é o forró Minha mulher não deixa não, de Reginho e Banda Surpresa. Sua letra divertida, que foi inspirada em um problema doméstico vivido por Reginho, é um diálogo entre dois amigos no qual um convida o segundo para se divertir e este diz que sua mulher não deixa. O hit já contagiou todo o País e é vídeo mais visto no Youtube. A música narra um amigo tentando chamar o outro para sair, beber e se divertir. A resposta? “Vou não, quero não, posso não, minha mulher não deixa não.” Já a música Liga da Justiça, do grupo Leva Nóiz, teve sua letra inspirada na amizade dos superamigos. Nas apresentações da banda, o vocalista se veste de Super-Homem e dança com duas Mulheres Maravilhas. Na letra, ele aconselha a Mulher Maravilha a fugir com o Superman. Porém, para conhecer os novos hits do carnaval, não precisa dar uma fugidinha para Salvador. Basta esperar sentado que logo os novos sucessos estarão por todos os lados e será quase impossível escapar deles.
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